2004-12-29

4.000 euros que se pagam muito, muito caro!

A Dona Alexandra Fernandes é uma engenheira agro-alimentar, manequim e a apresentadora de TV que entra quase a diário nas nossas casas, afirmando que é ela e que a outra, a do lado, é igualmente ela, mas com mais 4.000 euros.

Coitada da pobre Senhora! É uma escrava do trabalho e ainda assim o dinheiro não lhe chega... precisa de mais 4.000 euros para ter aquele ar de felicidade de quem vai a uma catedral de consumo, consumir a crédito.

Eu já sabia que os portugueses eram muito mal pagos, que há quem tenha de conseguir um segundo e um terceiro emprego para conseguir sobreviver no meio de tanto apelo ao consumo. Mas ao ver a Dona Alexandra Fernandes na televisão, parte-se-me o coração.

Ao que chegou este país! Uma engenheira agro-alimentar vê-se na contingência de ser manequim. Como, pelos vistos, os manequins não serão muito melhor pagos que os engenheiros agro-alimentares, a lógica é complementar essas actividades profissionais como apresentadora de TV. Trabalho esse igualmente mal remunerado, que leva à necessidade de ela ainda querer mais 4.000 euros.

Ora a Dona Alexandra Fernandes, engenheira, manequim e apresentadora de TV, tem uma vida agitada e não tem tempo a perder. Precisando dos tais 4.000 euros para apresentar aquele ar de felicidade, em lugar de perder tempo em arranjar um emprego melhor remunerado - coisa difícil nestas épocas de desemprego - prefere confiar na equipa Médiatis, a equipa do crédito imediato por telefone do Credifin.

Uma equipa muito simpática, que oferece «uma solução de crédito simples, cómoda, rápida, flexível, transparente e sem burocracias» em que basta dizer - «Eu quero. Eu já tenho.»

Ainda bem que neste país há equipas assim! Que facilitam tanto a vida às pessoas. Não sei o que seria da Dona Alexandra Fernandes sem equipas destas. Como andaria sem aquele ar de felicidade, aquele seu sorriso estampado no rosto do «e esta sou eu com mais 4.000 euros»!

Na realidade, tanta simpatia tem o seu preço, mas nada que não seja possível pagar. Ser uma pessoa feliz com mais 4.000 euros, custa apenas o reembolso de 160 euros mensais nos meses seguintes, onde já estão incluídos os juros à TAEG de 29,60%.

Em princípio, esta taxa de juro, 29,60%, até parece muito elevada se compararmos com a Taxa Euribor a seis meses, situada nos 2,185%, ou com a taxa de juro de um empréstimo concedido para aquisição própria, mas não é! Não podemos esquecer que é necessário tornar outras pessoas felizes com mais 4.000 euros, pagar os ordenados à simpática equipa, a publicidade e outros custos que permitem a qualquer um dizer - Eu quero! Eu já tenho. - Ora de onde vem tanto dinheiro? Nem mais! Acertou em cheio. Vem dos 27,415% de diferença entre a TAEG de 29,60% e a Taxa Euribor a 2,185%.

Mas o que são 29,60% de juros quando comparados com a quantidade de pessoas que podem ficar felizes com mais 4.000 euros? Nada! Uma autêntica ninharia. O que eu ainda não percebi foi como é que os nossos governantes, sempre tão aflitos com o equilíbrio do Orçamento do Estado, ainda não se lembraram da ideia... Então eles, que andam sempre a procurar exemplos da gestão privada, não poderiam implementar um serviço destes no Ministério das Finanças? Além de um excelente serviço, era um excelente negócio. Por exemplo, emprestavam 4.000 euros provenientes do dinheiro pago em IRS pelo próprio contribuinte. Bastava telefonar para a Repartição de Finanças e um funcionário responder - Programa de empréstimo quando o telefone toca, diga a frase...- ao que o contribuinte respondia - Eu quero! Eu já tenho.

O funcionário tomava nota dos dados e nem passadas 48 horas, o contribuinte já teria o dinheiro depositado na sua conta bancária. Ganharia assim o Estado não apenas o dinheiro do Imposto de Selo, devido pela abertura de crédito, os 19% de IVA correspondentes aos produtos comprados, mas também os tais 29,60% de juros sobre os 4.000 euros emprestados.

Quanto ao crédito fácil, a taxas de juro a rondar os 30%, retirem os caros leitores e as autoridades competentes as suas próprias conclusões.

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